Considerando a importância do futebol para a cultura brasileira, até que há poucos livros que tratam do tema no país. Por isso, o EL PAÍS preparou uma lista com o que há de melhor de novos e velhos clássicos que tratam do esporte nacional, seja em crônicas, quadrinhos, história, jornalismo, ensaios ou jornalismo. Aproveite em quanto é Copa do Mundo para ler alguns dos livros abaixo.

À Sombra das Chuteiras Imortais
Nelson Rodrigues (Companhia das Letras)

Quando o assunto é futebol, talvez esse seja o livro mais importante já lançado no Brasil. Coletânea de crônicas publicadas por Nelson Rodrigues entre 1955 e 1970, À Sombra das Chuteiras Imortais pega a transformação do Brasil no futebol, quando o país passa do trauma do Maracanazo de 1950, quando perdeu a final da Copa para o Uruguai em pleno Rio de Janeiro, para ser a seleção mais badalada do mundo, tricampeã com títulos em 1958, 1962 e 1970. É neste volume, que está, aliás, a famosa crônica que fala do “complexo de vira-lata” do brasileiro, expressão que transcendeu o futebol e ao longos dos anos foi lembrada para explicar uma série de comportamentos nacionais. Infelizmente, o livro está esgotado e sem reedições há alguns anos, contudo, é possível encontrá-lo em sebos sem muita dificuldade.

A Estrela Solitária
Ruy Castro (Companhia das Letras)

Verdadeiro clássico do jornalismo brasileiro, a biografia, publicada em 1996, refaz a trajetória de Garrincha, um dos maiores ídolos do futebol brasileiro. Enquanto jogou, entre os anos 1950 e 1960, o “anjo de pernas tortas” praticamente inventou o drible no futebol, criando jogadas que desconcertavam os adversários. Levou risos e aplausos para todas as arquibancadas em que jogava, mas desde que saiu a pequena cidade de Pau Grande, no Rio de Janeiro, onde foi descoberto, teve uma vida pessoal conturbada, marcada pelo alcoolismo. Ruy Castro reconstrói a trajetória única desse ídolo brasileiro que, ao lado do Pelé, foi um dos maiores que o futebol já viu.

O Drible
Sérgio Rodrigues (Companhia das Letras)

O livro começa com uma longa descrição de um dos lances mais memoráveis da história do futebol: na Copa de 1970, no México, Pelé arranca livre e, apenas usando o mudando a trajetória de sua corrida, engana o lendário goleiro uruguaio Mazurkiewicz. A bola vai para um lado, Pelé para o outro e o arqueiro permanece no meio, estatelado. Depois começa o reencontro. O jogador vai em busca da bola, chuta e ela sai triscando o travessão direito. O lance, um dos maiores da história de futebol, é uma verdadeira obsessão de Murilo Filho, um famoso cronista esportivo carioca que tem uma relação conflituosa com seu filho Neto, que não gosta de futebol. O romance, lançado em 2013, que tem a Copa do Mundo de 1970 e o esporte como pano de fundo, fala da relação entre pai e filho no ritmo de uma partida de futebol.

Dando Tratos à Bola
Hilário Franco Junior (Companhia das Letras)

Autor de outro livro acadêmico sobre futebol, o A Dança dos Deuses, Hilário Franco Junior reúne neste volume, publicado em 2017, sessenta ensaios que misturam usam da história, sociologia, economia, antropologia e psicologia para explicar o jogo e seus aspectos culturais. Os textos falam do uso político do futebol, da importância das torcidas para as sociedades e da construção feita ao redor de clubes como o Corinthians ou Flamengo, conhecidos como times da “massa”. Historiador e professor da Universidade São Paulo Franco Júnior obteve seu pós doutorado em história medieval, mas sua paixão pelo futebol está muito bem representada em Dando Tratos à Bola.

Ode a Mauro Shampoo e Outras Histórias da Várzea
Luiz Antonio Simas (Mórula)

Aqui não há lugar para os grandes feitos já conhecidos internacionalmente. Sai Pelé e entra Mauro Shampoo, o “craque” do pior time do mundo, o pernambucano Íbis. Durante a carreira de atacante, que dividia com o ofício de cabeleireiro nos anos 1980, Shampoo marcou apenas um gol, uma marca única que Luiz Antonio Simas faz questão de lembrar. Ao lado da ode ao atacante, o autor, que é historiador, traça o perfil de outros times pequenos, derrotas gloriosas e conquistas dos times de várzea espalhados por todo o Brasil. Publicado em 2017, é um retrato romântico do que, talvez, há de mais romântico no futebol brasileiro: o improviso e a vontade de jogar.

Os Beneditinos
José Trajano (Alfagura)

Terceiro romance do jornalista José Trajano, o divertido livro conta a história de Zezinho, um repórter desempregado que encontra no pequeno Juventus, de São Paulo, o outro pequeno América, do Rio de Janeiro, seu verdadeiro time de coração. Com evidente fundo autobiográfico, afinal, Trajano é possivelmente o torcedor mais conhecido e fanático do América, o livro começa na capital paulista, mas é na memória da época de ouro do Rio de Janeiro, entre as décadas de 1950 e 1960, que grande parte de sua ação se desenrola. O túnel do tempo é acessado a partir do dia em que o narrador, Zezinho, encontra no jornal uma notícia sobre walking football, futebol andando. É o que ele precisava para tentar reunir seu antigo time de um colégio no bairro da Tijuca, zona norte do Rio de Janeiro.

Gigantes do Futebol Brasileiro
João Máximo e Marcos de Castro (Civilização Brasileira)

Um compêndio de nada menos de 439 páginas que, de certa forma, começou a ser escrito em 1965 e só acabou recentemente. Lá atrás, nos anos 1960, os autores publicaram o livro com o perfil de 13 atletas, esquecendo-se de dois dos maiores craques brasileiros: Didi e Ademir. Acabaram virando alvo de críticas até de João Saldanha, o então técnico da seleção. Mais recentemente, em 2011, tiveram a chance de reparar a injustiça. Incluíram os dois jogadores e mais sete craques atuais. Os perfis contam tudo: os anos de formação, principais características, pontos altos e baixos da carreira. Ao todo, são 21 jogadores perfilados: Friedenreich, Fausto, Domingos da Guia, Leônidas, Tim, Romeu, Zizinho, Heleno, Ademir, Danilo, Nilton Santos, Didi, Garrincha, Pelé, Gerson, Rivelino, Tostão, Falcão, Zico, Romário e Ronaldo.

O Outro Lado da Bola
Álvaro Campos (Record)

O futebol continua sendo um ambiente extremamente conservador e preconceituoso contra homossexuais. Além dos gritos homofóbicos das torcidas brasileiras e estrangeiras, um dos indícios mais claro do tabu da homossexualidade no esporte é o fato de que nunca, nunca mesmo, nenhum jogador brasileiro se declarou homossexual. Por isso, a graphic novel O Outro Lado da Bola, recém-lançada é tão importante. O livro conta a história de Cris, um jogador, ídolo de torcedores fanáticos, que resolve se declarar gay depois do assassinato brutal de um ex-namorado. A partir desse ponto, sua vida pessoal e profissional é virada do avesso e ele, mesmo de luto, tem de enfrentar o preconceito da diretoria e torcida de seu clube. Nada distante da realidade não é mesmo?

Tempos Vividos, Sonhados e Perdidos
Tostão (Companhia das Letras)

Eduardo Gonçalves de Andrade, o Tostão, é um caso à parte no futebol. Um dos maiores jogadores brasileiros da história, ele foi campeão mundial em 1970 e, logo depois, aos 26 anos, encerrou sua carreira profissional precocemente. Depois, virou médico, professor de medicina, comentarista de TV, escritor e colunista de jornais. Leitor voraz, ele é um dos únicos futebolistas que se dedicou a pensar o futebol e neste livro de 2016, revê as últimas seis décadas do futebol brasileiro, misturando suas análises e ideias ao seu espírito de espectador, torcedor e fã.

O Futebol Explica o Brasil
Marcos Guterman (Contexto)

Da origem popular e operária do Corinthians, logo depois do desembarque do futebol via Inglaterra no Brasil, em 1910, a Fernando Collor, que estendia seu poder político em Alagoas ao CSA, clube em que foi dirigente antes de se tornar um ex-presidente impichado. É assim, entrelaçando a história do esporte e história do Brasil, que Guterman vai didaticamente explicando o país através do que aconteceu em campo nos últimos cem anos. No livro, além da relação entre política e futebol também há espaço para que o autor aborde a longa linhagem de craques brasileiros e suas derrotas, fracassos e peculiaridades.

Veneno Remédio
José Miguel Wisnik (Companhia das Letras)

Futebol cabeça. Neste grande ensaio sobre o futebol brasileiro, o músico e escritor José Miguel Wisnik fala do jogo reinventado pelos brasileiros entremeando temas como “democracia racial”, “homem cordial” e antropofagia cultural do estrangeiro. Bem ao estilo do autor, o texto lança mão da psicologia, filosofia e crítica estética ao lembrar craques como Domingos da Guia, Pelé, Garrincha, Romário e Ronaldo.

 

Fonte: El País | André de Oliveira